quarta-feira, 5 de setembro de 2018

A REFLEXÃO SOBRE A FAMÍLIA


Alexandre Garcia

Na semana passada, em Brasília, um grupo de dez jovens massacrou a pancada um jovem asmático de 16 anos, que morreu segurando entre os dedos ensangüentados o tíquete com que ia comprar pão para a família. O episódio chocou a capital do país e levou à reflexão sobre o que levou os espancadores a agirem com alegre crueldade. De que ovos saíram essas serpentes, em que ninho foram criadas, de que famílias, de que escolas, de que meio, de que cidade? O estímulo à reflexão, ainda que tardia, pode ser o legado do jovem morto.
Leio nos jornais o anúncio do filme da Globo no domingo passado, “Atração Fatal”. Invariavelmente, os jornais criticam o filme, taxando-o de “moralista”, como se fosse criticável o fato de uma dona-de-casa defender seu lar. Um colega meu, ao comentar o massacre do jovem brasiliense, me diz, meio envergonhado; “Sei que vão me chamar de careta, mas foi a falência das famílias daqueles meninos que os levou à violência”. Em certo meio, família é “careta” – embarcamos na pregação dos que, não tendo família, se tornam inimigos dela.
Recordo a ausência de parentes em enterros de meninos mortos na Candelária, e me pergunto se eles não teriam pais amorosos na Europa, se nós jornalistas, não estivéssemos fazendo sensacionalismo para impedir a adoção por estrangeiros, de crianças brasileiras abandonadas.
Ouço a revolta do jornalista Antonio Martins, cujo filho foi espancado pelo mesmo grupo que matou o menino asmático. Martins, que está exilando o filho para proteger-lhe a vida, condena as leis irresponsáveis que permite a impunidade de assassinos. Agora que filhos de jornalistas são mortos e espancados, nós, jornalistas, também somos levados a refletir sobre por que achamos que a defesa da família deve ser condenada como “moralista” e por que é “careta” a família, e se não é desumano fazer sensacionalismo contra o resgate, por casais do primeiro Mundo, de bebês que não ser meninos de rua.
Alunos da 3ª. série da Escola Indi/Bibia, de Brasília, mandaram uma carta ao governador dizendo que “os pais que têm medo de dizer não para os filhos, de castigá-los e de puni-los, estão, na verdade, criando e entregando marginais para conviver em sociedade”. Mais adiante, as crianças descobrem: “As mesmas pessoas que os condenam são aquelas que nada fizeram para impedir o fato; quem age assim, mata também”. Até as crianças sabem.
Quando uma mãe, querendo ser moderninha, trata a filha como “amiga” fico perguntando se a filha, que já tem muitas amigas, não sente falta de ter uma única e sábia mãe. Quando um pai, fingindo que é avançado, chama o filho de “cara”, fico perguntando se o filho não deseja ardentemente ser chamado de um caloroso e amoroso “meu filho”.

Extraído de O Diário de Mogi 17/08/1993

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