Alexandre
Garcia
Na
semana passada, em Brasília, um grupo de dez jovens massacrou a
pancada um jovem asmático de 16 anos, que morreu segurando entre os
dedos ensangüentados o tíquete com que ia comprar pão para a
família. O episódio chocou a capital do país e levou à reflexão
sobre o que levou os espancadores a agirem com alegre crueldade. De
que ovos saíram essas serpentes, em que ninho foram criadas, de que
famílias, de que escolas, de que meio, de que cidade? O estímulo à
reflexão, ainda que tardia, pode ser o legado do jovem morto.
Leio
nos jornais o anúncio do filme da Globo no domingo passado, “Atração
Fatal”. Invariavelmente, os jornais criticam o filme, taxando-o de
“moralista”, como se fosse criticável o fato de uma dona-de-casa
defender seu lar. Um colega meu, ao comentar o massacre do jovem
brasiliense, me diz, meio envergonhado; “Sei que vão me chamar de
careta, mas foi a falência das famílias daqueles meninos que os
levou à violência”. Em certo meio, família é “careta” –
embarcamos na pregação dos que, não tendo família, se tornam
inimigos dela.
Recordo
a ausência de parentes em enterros de meninos mortos na Candelária,
e me pergunto se eles não teriam pais amorosos na Europa, se nós
jornalistas, não estivéssemos fazendo sensacionalismo para impedir
a adoção por estrangeiros, de crianças brasileiras abandonadas.
Ouço
a revolta do jornalista Antonio Martins, cujo filho foi espancado
pelo mesmo grupo que matou o menino asmático. Martins, que está
exilando o filho para proteger-lhe a vida, condena as leis
irresponsáveis que permite a impunidade de assassinos. Agora que
filhos de jornalistas são mortos e espancados, nós, jornalistas,
também somos levados a refletir sobre por que achamos que a defesa
da família deve ser condenada como “moralista” e por que é
“careta” a família, e se não é desumano fazer sensacionalismo
contra o resgate, por casais do primeiro Mundo, de bebês que não
ser meninos de rua.
Alunos
da 3ª. série da Escola Indi/Bibia, de Brasília, mandaram uma carta
ao governador dizendo que “os pais que têm medo de dizer não
para os filhos, de castigá-los e de puni-los, estão, na verdade,
criando e entregando marginais para conviver em sociedade”.
Mais adiante, as crianças descobrem: “As mesmas pessoas que os
condenam são aquelas que nada fizeram para impedir o fato; quem age
assim, mata também”. Até as crianças sabem.
Quando
uma mãe, querendo ser moderninha, trata a filha como “amiga”
fico perguntando se a filha, que já tem muitas amigas, não sente
falta de ter uma única e sábia mãe. Quando um pai, fingindo que é
avançado, chama o filho de “cara”, fico perguntando se o filho
não deseja ardentemente ser chamado de um caloroso e amoroso “meu
filho”.
Extraído
de O Diário de Mogi 17/08/1993
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